quinta-feira, 15 de maio de 2014

De que trata o Direito Financeiro?


A evolução histórica da humanidade no tocante à vida em sociedade passou por diversos estágios que foram evoluindo desde os primeiros clãs e tribos primitivas, passando por formas cada vez mais sofisticadas e complexas de agrupamentos sociais, até chegarmos, em tempos modernos, ao surgimento da figura do Estado como o ente central de organização política sem o qual o convívio social nas modernas sociedades seria inviável, visto que para ser possível este convívio temos que ter meios de compatibilizar as necessidades individuais das pessoas com as coletivas e as públicas num espaço territorial delimitado. Essencialmente ao Estado cabe definir "as regras do jogo", isto é, regulamentar o convívio em sociedade, estabelecendo e fazendo cumprir, toda a legislação necessária para resolver conflitos, proteger os cidadãos uns dos outros e a todos de ameaças externas. Ao Estado cabe ainda as relações com outros Estados. 
Estas funções essenciais na verdade se desdobram numa infinidade de atividades que precisam ser realizadas todos os dias para que a plena existência do Estado se concretize. Como ente central de uma determinada sociedade, o Estado, paradoxalmente, é uma entidade virtual, uma concepção ou uma ideia, que se materializa somente na figura de um Governo.
O Governo, como materialização do Estado, é um conjunto de instituições compostas de meios materiais e, principalmente, humanos, encapsulados num arcabouço legal que o define e limita. Tipicamente um modelo moderno de governo republicano é o de um todo dividido em três poderes: Executivo, Legislativo e Judiciário, na dimensão horizontal e em níveis nacional, estadual ou provincial e até municipal, na dimensão vertical. Estes poderes e diferentes níveis de governo tem, cada um, suas funções definidas e, para executá-las, se organizam dividindo-se em órgãos menores, que por sua vez também dividem-se novamente em outros órgãos ainda menores, até chegar àqueles que efetivamente executarão as políticas públicas ou tarefas e atividades de interesse público. Tudo isso faz dos governos grandes empregadores de mão de obra em todas as sociedades modernas.
Do ponto de vista econômico o Governo é uma entidade estéril porque não tem nem gera riquezas próprias. Por outro lado ele existe para executar as funções e obrigações do Estado, para o que há a necessidade de muitos recursos. Com isso surge a questão de como viabilizar a execução das funções do Estado pelo Governo, uma vez que o trabalho necessário para isso precisa ser remunerado e a remuneração se faz com riquezas, ou dinheiro, em última instância.
Ainda sob este ponto de vista econômico e financeiro, as funções básicas do Estado que devem ser desempenhadas pelo Governo são a alocativa, a distributiva e a estabilizadora. A função alocativa refere-se à aplicação dos recursos públicos com a finalidade de prover bens públicos, como forças armadas, parques nacionais ou rodovias, por exemplo; a função distributiva trata da distribuição e repartição das receitas públicas, como por exemplo para financiar um sistema público universal de saúde ou tratar da repartição de receitas entre a União, os Estados e os Municípios; a função estabilizadora trata dos deslocamentos de recursos que o governo faz, geralmente em sentido contrário aos dos mercados, com a finalidade de garantir um elevado nível de emprego, a estabilidade da economia e o bem estar da sociedade, livre de choques e oscilações econômicas. 
Então, para possibilitar o cumprimento das missões fundamentais do Estado, este tem que se materializar na forma de um Governo, e este, por sua vez, para existir e operar, precisa se financiar, tanto para executar as funções do Estado, comprando bens e serviços no mercado ou distribuindo recursos diretamente às pessoas necessitadas, quanto para remunerar as pessoas que compõem o próprio governo. Este financiamento se dá através da tributação, que é a derivação de parte das riquezas geradas pela sociedade para o Tesouro Público, através de impostos, taxas e contribuições, a que todos são compulsoriamente submetidos, pessoas físicas e pessoas jurídicas de direito privado, isto é, empresas.
Finalmente, para regular as relações do governo com os seus próprios órgãos, com os governos subnacionais e com os governados, que somos todos nós contribuintes, no tocante ao financiamento discutido no parágrafo anterior , necessário, este financiamento, em última análise, para garantir a própria existência do Estado, surgem conceitos como Receita Pública, Despesa Pública, Orçamento Público e tributação, entre outros, que são tratados por ramos específicos do Direito, como o das Receitas Públicas, o Tributário  e o Orçamentário, todos estes por sua vez agrupados sob um grande ramo do Direito Público a que chamamos de Direito Financeiro.

Por: Délcio C. da Silva
Curso de Gestão de Políticas Públicas - Escola de Artes, Ciências e Humanidades - Universidade de São Paulo