Numa trajetória já longa de leitor atento e
observador da conjuntura brasileira, uma característica dos nossos homens e
mulheres públicas, tanto eleitos quanto concursados, se me torna
vergonhosamente evidente. Invariavelmente querem se dar bem, ter uma vantagem,
se arrumar, botar o burro na sombra, à custa dos pagadores de impostos. Não bastam as estabilidades dos empregos e as aposentadorias integrais, querem sempre mais, de modo
que o parasitismo do Estado é uma característica que, enquanto não for
enfrentada para valer, não nos deixará nunca a nos tornar uma sociedade justa e
desenvolvida.
- Ah, mas não são todos!
- Ok, o fato de haver exceções não invalida o
raciocínio acima porque, para todos os efeitos, é uma característica dominante,
que atropela e cala, até os tempos atuais, as poucas vozes dissonantes.
Vejamos alguns breves exemplos que me veem à memória, para ilustrar o que estou a dizer:
Em Outubro de 1999 Anthony Garotinho, então
Governador do Rio de Janeiro, cuja Vice-governadora, Benedita da Silva,
pertencia ao PT, reclamou que este deveria mudar o nome para "Partido da
Boquinha" (https://www1.folha.uol.com.br/fsp/brasil/fc2310199908.htm).
"Eles têm mais de 200 cargos no meu governo e estão querendo mais".
Os Petistas, que àquela altura estavam há duas décadas construindo e cultivando
cuidadosamente uma imagem de Partido diferente de "tudo isso que está
aí", com seus parlamentares abrindo CPI a torto e à direita, verdadeiros
Anjos Vingadores dos despossuídos brasileiros, após as declarações de
Garotinho, subiam pelas paredes, rasgavam as vestes , viravam os olhos e
espumavam da mais doída indignação, da mais pungente revolta contra seu
parceiro tornado rival... Três anos depois Lula foi eleito Presidente da
República, o petismo e seus aliados, que iam da extrema esquerda até o Centrão,
trataram logo de abocanhar cada um seu naco de carne e ser feliz. Acabaram
exagerando e sendo desembarcados do poder, mas só após quatro eleições
consecutivas. Assim, não há dúvidas de que Garotinho tinha toda razão quando
afirmou o que afirmou, lá atrás.
Saindo do contexto partidário, vemos a elite
do nosso funcionalismo, com suas vantagens, seus penduricalhos e seus
privilégios. Pouco importa a condição do país, seus "direitos" têm
sempre prioridade. Sempre é tempo de se autoconcederem um agrado tungado da cidadania. Agora mesmo, todos os milhões de brasileiros que estão fora
do serviço público, autônomos, empregados formais, informais, desempregados,
empresários, artistas, esportistas, todos estão sofrendo prejuízos e passando
apertos financeiros em função da Pandemia de Corona vírus, que gera
paralisação, desemprego e desesperança. Mas os funcionários públicos, atrás de
sua estabilidade e salário garantidos, exigem ter aumento, querem achar uma
brecha para enfiar um Auxílio Saúde qualquer (https://www.conjur.com.br/2020-mai-06/mp-mt-institui-ajuda-custo-membros-durante-epidemia).
Enfim, não largam o osso.
Ao longo da vida profissional tive
oportunidade de lidar com militares, várias patentes, de Sargento a Coronel. E
sempre, desde o início, para minha decepção, que antes os admirava tanto que
até pensei na juventude em me tornar um deles, percebi, em quase todos, como um traço cultural mesmo, de
forma mais ou menos disfarçada, a busca pela boquinha, desde o simples almoço
grátis, passando pela extensão desnecessária da missão de um dia para uma
semana para embolsar as diárias, a transferência de posto arranjada a pedido,
para embolsar o auxílio mudança (dá para trocar de carro com isso), dentre
outras coisinhas feias. Tudo isso me
leva a observar com extremo desgosto e nenhuma surpresa, porque é só mais do
mesmo que já vi antes, um bando de generais e outros altos oficiais aposentados
disputando a tapa uma boquinha no governo de um ex-capitão indisciplinado. Aliados à extrema-direita mais autoritária e reacionária. Não se importam se
isso suja a imagem de suas instituições, se correm o risco de sofrer alguma
humilhação (vários já sofreram). Tudo o que querem é dobrar ou triplicar a
renda, somando salários aos gordos proventos de aposentados.
A conclusão a que chego é essa: de A a Z,
todos vêem o Estado como uma enorme teta que deve ser mamada, quanto mais,
melhor. Enquanto o pagador de impostos não se cansar e der um basta nesse
parasitismo, passará a vida assim, trabalhando duro para alimentar um Estado
insaciável.